Produção do conhecimento em
EAD: Um elo entre professor – curso – aluno
Maria
Carolina Santos de Souza*
mcarol@unifacs.br / mcarols@uol.com.br
TERESINHA FROÉS BURNHAM**
RESUMO O tema abordado neste documento reúne
conceitos relacionados a utilização dos recursos tecnológicos com a finalidade
de subsidiar a troca de informação e a produção colaborativa do conhecimento
por professores e alunos participantes de um curso à distância. Para que a
utilização destes recursos seja satisfatória ressalta-se a necessidade de haver
o entendimento da linguagem adotada por estas mídias. Além disso, com o
objetivo de propiciar uma relação mais estreita entre alunos, professores e curso
sugere-se algumas estratégias destinadas a elaboração e realização das
atividades didático-pedagógicas propostas no curso como forma de possibilitar a
criação e compartilhamento do conhecimento em rede colaborativa.
Palavras-Chaves: EAD,
Informação, Conhecimento, Tecnologia.
A partir da evolução das Tecnologias da Informação e
da Comunicação (TICs) percebe-se a possibilidade de haver mudanças
significativas na área educacional. Assim como em outros campos de atuação, o
ambiente acadêmico integrado às TICs tem propiciado a disponibilização de novas
alternativas voltadas à produção e compartilhamento do conhecimento.
Através do uso de diversos recursos tecnológicos,
antigas limitações são resolvidas e, então, torna-se possível estabelecer
outros mecanismos para troca de informação, interação e colaboração entre os
envolvidos no processo de ensino-aprendizagem. Alunos e professores (em especial)
adotam as mídias objetivando dinamizar este processo, enriquecendo
principalmente o conhecimento produzido durante o mesmo.
É importante ressaltar que a adoção das mídias está
associada a um pré-requisito que deve ser atendido em prol da sua exploração de
forma mais adequada. Este requisito se refere à compreensão da linguagem
adotada por estes recursos pelos alunos e professores.
No momento em que a linguagem é compreendida a
utilização da tecnologia favorece a realização de experiências criativas e inovadoras.
Por exemplo, a educação à distância agora também mediada pelo computador vence
os limites geográficos - respeitando a velocidade em que a informação tem
navegado em diferentes redes eletrônicas; reconfigura a dimensão temporal e
estende o espaço físico da sala de aula - criando novos espaços virtuais que
ampliam as possibilidades de contato entre professores e alunos. Com essas
alterações, dentre outros benefícios, observa-se um esforço maior para motivar
a interatividade e a execução de trabalhos colaborativos em rede por
professores e alunos.
Por outro lado, observa-se que a distância geográfica
existente entre os participantes de cursos à distância ainda dificulta a
garantia da interação entre os mesmos. Além disso, a não exposição física,
principalmente nos cursos oferecidos totalmente à distância, provoca, muitas
vezes, a falta de compromisso tanto por parte dos alunos como do professor.
Esses dois fatores, geralmente, promovem o desligamento ou conclusão antecipada
do curso pelos envolvidos.
Neste sentido, percebe-se que um valioso elo para
garantir uma maior integração entre alunos/professores
e curso está nas atividades
propostas pelo professor. Ou seja, através das atividades sugeridas pode-se
estimular o uso das informações distribuídas em diferentes locais do ambiente
de aprendizagem, motivar o trabalho colaborativo, interação profunda, a
produção e compartilhamento de conhecimentos (tácitos e explícitos) entre
os participantes de determinado curso.
Este documento irá apresentar algumas estratégias destinadas ao
desenvolvimento de atividades didático-pedagógicas a partir da adoção das TICs
e de acordo com o modelo de produção do conhecimento proposto por Nonaka e
Yakeuchi. Será abordada também linguagem das mídias, já que o seu entendimento
representa um passo inicial para a exploração satisfatória destes recursos
tecnológicos. Além disso, serão descritas algumas tecnologias que podem ser
utilizadas em EAD (através da Internet), destacando suas finalidades, alguns
pré-requisitos e recomendações.
2. A LINGUAGEM
DAS MÍDIAS
Os meios
de comunicação operam imediatamente com o sensível, o concreto, principalmente,
a imagem em movimento. Combinam a dimensão espacial com a cinestésica, onde o
ritmo torna-se cada vez mais alucinante (como nos videoclips). Ao mesmo tempo
utilizam a linguagem conceitual, falada e escrita, mais formalizada e racional.
Imagem, palavra e música se integram dentro de um contexto comunicacional
afetivo, de forte impacto emocional, que facilita e predispõe a conhecer mais favoravelmente.
[Moran, 1994, p.6].
Nestes últimos anos, observa-se a representativa
evolução dos meio comunicacionais que otimizam seus mecanismos audiovisuais
integrando diversas mídias e suas respectivas linguagens. Esta integração
acontece gradativamente com o intuito de oferecer ambientes propícios à
interação e ao desenvolvimento do conhecimento pelos seus usuários.
O ponto de partida para garantir a integração é o
entendimento do verdadeiro significado dos mecanismos audiovisuais. Johnson
cita, por exemplo, que a grande inovação do computador não está em sua
capacidade de realizar cálculos numéricos, mas sim na idéia deste ser “(...) um
sistema simbólico, uma máquina que lida com representações e sinais”. [Johnson,
2001, p.17].
Segundo Moran (1994) os meios audiovisuais têm a
possibilidade de “[...] articular, combinar, integrar a lógica convencional
(mais organizada e seqüencial) com a paralela, associadora, uma lógica
"puntilhista", multidimensional, repleta de pontos fortes, reforçada
pelos efeitos sonoros e pela inserção de trilhas musicais“ [Moran, 1994, p.9].
Entretanto, para que esses meios sejam
melhor explorados é necessário compreender a linguagem adotada pelos mesmos.
Essa linguagem, assim como as outras, também é
construída a partir de signos e regras que servem para codificar e definir a
representação das suas informações. Como destaca Babin (1989), no caso da
linguagem escrita, o principal são suas palavras e a suas colocações. Então,
aquele que escreve bem é aquele que utiliza as palavras certas e faz ligações
exatas entre estas. Já a linguagem audiovisual enfatiza o efeito que uma
mensagem provoca para seu receptor. Assim, utilizando os recursos eletrônicos,
a linguagem audiovisual emite mensagens que ganham novas formas (utiliza-se imagens,
sons e animações), em relação às mensagens escritas, podendo passar uma
sensação de maior proximidade entre o receptor e o emissor.
No geral, a linguagem audiovisual, como afirma Lévy
(1993), permite e pode-se dizer que estimula o usuário a acessar a informação
de forma não linear. Esta característica, em especial, propícia novos processos
de recepção e envio de mensagens, além de motivar, dentre outras coisas, a
interatividade. Estas alterações podem ser visualizadas, por exemplo, quando se
utiliza a metáfora do Hipertexto[1].
Diante do apresentado pode-se perceber que quando o
assunto é Educação à Distância (EAD) a compreensão da linguagem adotada por
essas mídias é de suma importância; porque, neste caso, a adoção das TICs
estimulam alterações comportamentais -
em relação aos conceitos de tempo, espaço, fluxo da informação e por
conseqüência dos mecanismos comunicacionais - que são viabilizadas através do
uso de recursos eletrônicos (ferramentas de comunicação, ferramentas para
pesquisa e armazenamento de informação). Na seção seguinte será possível
observar as diferentes experiências em educação à distância, influenciadas pela
adoção das mídias e da linguagem audiovisual.
3 AS TICs NA
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
De acordo com os avanços tecnológicos, vem sendo
oferecido para os usuários das mídias em geral, várias ferramentas de
comunicação e gerenciamento da informação. A maioria dessas ferramentas pode
ser disponibilizada na Internet. Em alguns sistemas hospedados, na rede,
encontram-se ferramentas reunidas e organizadas em um único espaço virtual,
visando oferecer ambiente interativo e adequado à transmissão da informação,
desenvolvimento e compartilhamento do conhecimento. No geral, esses recursos
tecnológicos são agrupados de acordo com a sua funcionalidade: comunicação e
gerenciamento de informação.
Na educação à distância, as ferramentas de
comunicação[2] são adotadas
com o objetivo de facilitar o processo de ensino-aprendizagem e estimular a
colaboração e interação entre os participantes de um curso, habilitando-os para
enfrentar a concorrência do mercado de trabalho. As ferramentas de
gerenciamento, não são menos importantes; sobretudo porque, a participação e
progresso do aluno são informações que precisam ser recuperadas, para que o
tutor/professor possa apoiar e motivar o aprendiz durante o processo de
construção e compartilhamento do conhecimento (Quadro 1).
Quadro 1 -
Exemplos de ferramentas de comunicação e de
informação
Alguns Exemplos |
Categoria |
Descrição |
Correio Eletrônico |
Comunicação |
Indicado para enviar e receber arquivos anexados às
mensagens, esclarecer dúvidas, dar sugestões, etc. |
Chat |
Comunicação |
Permite a comunicação de forma mais interativa e dinâmica.
Em cursos de EAD essa ferramenta é utilizada como suporte para a realização
de reuniões e discussões sobre assuntos trabalhados no curso. Este recurso é
também denominado de bate-papo. |
Fórum |
Comunicação |
Mecanismo propício ao desenvolvimento de debates. O Fórum
é organizado de acordo com uma estrutura de árvore em que os assuntos são dispostos
hierarquicamente, mantendo a relação entre o tópico lançado, respostas e
contra-respostas. |
Lista de Discussão |
Comunicação |
Auxilia o processo de discussão através do direcionamento
automático das contribuições relativas a determinado assunto, previamente
sugeridos, para a caixa de e-mail de todos os inscritos na lista. |
Mural |
Comunicação |
Aluno e professores podem disponibilizar mensagens que
sejam interessantes para todo a turma. Essas mensagens, geralmente, são:
divulgação de links, convites para
eventos, notícias rápidas, etc. |
Portfólio |
Comunicação/gerenciamento |
Também chamado de sala de produção, é uma ferramenta que
auxilia a disponibilização dos trabalhos dos alunos e realização de
comentários pelo professor e colegas da turma. |
Anotações |
Gerenciamento/comunicação |
É uma ferramenta de gerenciamento de notas de aulas,
observações, conclusão de assuntos, etc. Em alguns casos, este recurso possui
a opção de configuração para compartilhamento com todos alunos e professores,
apenas professores e ainda não compartilhado. Neste último tipo, apenas o
autor da anotação poderá visualiza-la.
Também é denominada de Diário de Bordo. |
FAQ |
Gerenciamento/ comunicação |
Também conhecido por Perguntas Freqüentes, esta ferramenta
auxilia o tutor/professor a responder as perguntas mais freqüentes. Dessa
forma, há uma economia de tempo e o aluno pode, ao invés de questionar o
professor, consultar a ferramenta para verificar se já não existe uma
resposta para sua dúvida disponibilizada no ambiente. |
Perfil |
Gerenciamento |
Auxilia a disponibilização de informações (tais como:
e-mail, fotos, mini-curriculo) pessoais dos alunos e professores do curso. |
Acompanhamento |
Gerenciamento |
A ferramenta, geralmente,
apresenta informações que auxiliam o acompanhamento do aluno pelo professor,
assim como, o auto-acompanhamento por parte do aluno. Os relatórios gerados
por essa ferramenta apresentam informações relativas ao histórico de acesso
ao ambiente de aprendizagem pelos alunos, notas, freqüência por seção do
ambiente visitada pelos alunos, histórico dos artigos lidos e mensagens
postadas para o fórum e correio, participação em sessões de chat, mapas de interação entre os
professores e alunos. |
Avaliação (on-line) |
Gerenciamento /comunicação |
Esta ferramenta envolve as avaliações que devem ser feitas
pelos alunos e recursos on-line para que o professor corrija as avaliações.
Do mesmo modo, fornece informações a respeito das notas, registro das
avaliações que foram feitas pelos alunos, tempo gasto para resposta, etc. |
Em cursos à distância, a interatividade e a
comunicação multidirecional são possíveis devido à adoção destas ferramentas,
as quais oferecem subsídios para que os participantes dos cursos possam se
comunicar. Possibilita ainda, a integração desses recursos em um único ambiente
de aprendizagem, favorecendo a adoção e compreensão da linguagem audiovisual.
Na EAD a informação pode ser, basicamente,
transmitida através de uma conversação[3],
utilizando ferramenta de comunicação síncrona e assíncrona. Isto acontece, por
exemplo, nas sessões de chat. Em
alguns casos, acontece também a troca da informação de um usuário para uma
ferramenta (“interação”). Esta ferramenta recebe a informação, processa e emite
nova informação para o usuário. Isto acontece muito quando, em um curso à distância,
é adotada alguma ferramenta de avaliação (on-line), onde a correção é
automática. No Quadro 2 as ferramentas
de comunicação estão organizadas de acordo com as suas relações com os
conceitos de tempo e espaço.
Quadro 2 -
Tempo, espaço e mecanismos comunicacionais.
Tempo Espaço |
Síncrono [4] |
Assíncrono [5] |
Mesmo Local |
Encontros Presenciais face-a-face |
Portfólio ou sala de produção Mural Anotações Avaliação (on-line) Fórum |
Local Diferente (distribuída) |
Chat: salas de bate-papo Videoconferência |
Listas de Discussão Correio Eletrônico |
Fonte: Adaptado de Campos e
Giraffa (1999)
(...)
assincronicidade não deve ser vista somente como uma forma de interação para os
participantes que não possuem um horário em comum. Mais do que simples
alternativa ”temporal“ deve estar alicerçada num projeto pedagógico, deve ser
acompanhada e incentivada para que a comunicação não seja intensa no início e
fraca ou inexistente no final do curso. [Campos; Giraffa, 1999, p.2]
Geralmente, as ferramentas reunidas em um ambiente de
aprendizagem têm como principal objetivo apoiar o desenvolvimento das
atividades propostas pelo professor. É importante considerar os pré-requisitos, recomendações e problemas
identificados, em relação ao uso de alguns dos recursos tecnológicos, citados
anteriormente. Estas informações foram coletadas durante a realização de dois
cursos semipresenciais, em 2002 e 2003, de Engenharia de Software[6]
e, posteriormente, organizados no quadro a seguir (Quadro 3). Ressalte-se que
alguns pré-requisitos, por serem necessários para o uso de todas as
ferramentas, não foram incluídos na tabela. São estes:
o O tutor/professor deve conhecer a ferramenta;
o Os alunos devem ser capacitados para utilizar os
recursos;
o A interface da ferramenta deve ser amigável.
Quadro 3 -
Requisitos pedagógicos, recomendações e problemas
identificados em relação a ferramentas de comunicação e de gerenciamento.
Ferramenta |
Pré-requisitos |
Recomendações |
Problemas identificados |
Chat |
¡
É necessário haver uma metodologia para conduzir a
atividade; ¡ As
turmas devem ser pequenas – No máximo 20 alunos. |
¡ Realização
de debates síncronos, reuniões privadas, seção de tira-dúvidas e
confraternização dos participantes. |
¡
Tempo mal administrado; ¡
Fuga do tema proposto; ¡ Metodologia
inadequada. |
Fórum |
¡
É necessário haver uma metodologia para conduzir a
atividade; ¡
Os assuntos propostos devem ser relevantes e
estimular a discussão; ¡
Os debates devem ser encerrados seguindo o
cronograma de atividades do curso; ¡
O número de participantes pode ser grande. |
¡
Realização de debates assíncronos, exposição de
idéias e divulgação de informações diversas. |
¡
Fuga do tema; ¡
Tema proposto inadequadamente; ¡
Baixa Interação |
Lista de Discussão |
¡
É importante que as mensagens enviadas
sejam objetivas; ¡
fluxo de envio de mensagens deve ser
dinâmico; ¡
Os temas sugeridos devem estimular a
discussão; ¡
As turmas podem ser grandes; ¡
Os debates devem ser encerrados seguindo o
cronograma de atividades do curso; |
¡
Realização de debates assíncronos, exposição de
idéias e divulgação de informações diversas. |
¡
Fuga do tema proposto inadequadamente; ¡ Baixa
interação. |
Correio Eletrônico |
¡
É importante que as mensagens enviadas
sejam objetivas; ¡
As respostas devem ser dadas em um curto período de
tempo. |
¡
Indicado para a circulação de mensagens privadas,
definição de cronogramas e transmissão de arquivos anexados a mensagens. |
¡
Envio de mensagens extensas; ¡
Circulação de mensagens fora do escopo do curso; ¡
Arquivos anexados contaminados com vírus. |
FAQ |
¡
Desenvolvimento de metodologia para organização das
perguntas e repostas; ¡
Objetividade e clareza nas respostas; ¡
Atualização periódica das respostas. |
¡
Divulgação de instruções básicas referentes à
utilização das ferramentas e sobre o ambiente de aprendizagem; ¡
Esclarecimento de dúvidas sobre o conteúdo
discutido no curso. |
¡
Respostas e perguntas formuladas não são claras; ¡
Inadequação na organização das perguntas e
respostas. |
Avaliação (on-line) |
¡
Escolha de uma metodologia adequada para elaboração
das avaliações; ¡
Mecanismos de avaliação dos resultados devem ser
satisfatórios, flexíveis e obedecer a critérios semânticos. |
¡
Acompanhamento do aprendizado do aluno; ¡
Realização de avaliações complementares. |
¡
Inexistência de mecanismo que garanta que foi o
aluno que fez a avaliação (a não ser que se utilize a videoconferência) |
Acompanhamento |
¡ Analise
periódica dos dados. |
¡
Acompanhamento da
participação do aluno e do tutor. |
¡
Algumas ferramentas de acompanhamento não são
confiáveis. |
Diante de todas as características citadas,
percebe-se notar a importância da utilização das ferramentas computacionais em
sistemas de EAD devido à criação de possibilidades de maior interação entre os
professores/tutores e seus alunos. Entretanto, é indispensável ter conhecimento
dos pré-requisitos que estão associados a cada recurso, as recomendações e
problemas relacionados ao seu uso; com a finalidade de se ter o melhor
aproveitamento possível das ferramentas.
3 a produção e
compartilhamento do conhecimento em ead
O
conhecimento é um processo que prevê a condição de reelaborar o que vem como um
"dado", possibilitando que não sejamos meros reprodutores; inclui a
capacidade de elaborações novas, permitindo reconhecer, trazer à superfície o
que ainda é virtual, o que, na sociedade, está ainda mal desenhado, com
contornos borrados. Para tanto, o conhecimento prevê a construção de uma visão
que totalize os fatos, inter-relacionando todas as esferas da sociedade,
percebendo que o que está acontecendo em cada uma delas é resultado da dinâmica
que faz com que todas interajam, dentro das possibilidades daquela formação
social, naquele momento histórico; permite perceber, enfim, que os diversos
fenômenos da vida social estabelecem suas relações tendo como referência a
sociedade como um todo. Para tanto, podemos perceber, as informações –
fragmentadas – não são suficientes. [Bacegga, 2001, p.01]
A informação é formada por um conjunto finito de
dados que possuem semântica. Sua significação difere de acordo com a
interpretação de cada indivíduo que tem acesso
a ela e, ainda, é influenciada pelos fatores de tempo, forma de transmissão e
suporte tecnológico utilizado. Uma boa tradução para o termo “informação” é
fornecida por Sveiby (1998) que relaciona esta ao conhecimento tácito[7].
(...)
Quando falamos ou escrevemos, utilizamos a linguagem para articular alguns de
nossos conhecimentos tácitos, na tentativa de transmiti-los a outras pessoas.
Chamo esse tipo de comunicação de informação
[Sveiby, 1998, p.47].
O conhecimento, como afirma Sveiby (1998), tem uma
qualidade dinâmica refletiva em verbos como aprender,
esquecer, lembrar e compreender; as
informações fragmentadas não são consideradas suficientes para a sua produção.
Como afirma Baccega (2001, p.1), o conhecimento “(...) se baseia na
inter-relação e não na fragmentação”. O
conhecimento se refere à totalidade, ou melhor, a um conjunto de informações,
altamente integradas, que pode ser reformulado em prol da elaboração do novo,
aquilo que ainda é virtual. Ou seja, algo a ser realizado.
Outro fato a ser apontado, quando se pensa em
distribuição de conhecimento, é a importância de se avaliar como o seu contexto
interpretativo será compartilhando entre um agente humano que produz o
conhecimento e deseja disponibilizá-lo para outro.
(...) o
uso efetivo de tecnologia de informação para comunicar conhecimento requer que
o contexto interpretativo seja compartilhado também. Quanto mais comunicadores
compartilham conhecimentos similares, experiências e conhecimento anteriores,
maior será a eficiência da comunicação do conhecimento por canais de mediação
digital. [Santos, 2002, p.5].
Em sistemas de EAD o ambiente de aprendizagem deve
ser projetado, levando-se em consideração a necessidade de oferecer para o
usuário espaços virtuais onde o contexto interpretativo seja compartilhado.
Para que haja este compartilhamento é preciso disponibilizar, no ambiente,
ferramentas de comunicação e gerenciamento de informação que atuem como canais
de mediação digital (Figura 1).
Esta
mediação permite que os participantes do curso interajam, havendo, basicamente,
o compartilhamento e produção dos conhecimentos tácitos e explícitos[8].
Figura 1 –
A relação entre: conhecimentos, informação e
ferramentas.
Ao direcionar a discussão para a EAD, evidencia-se a
correlação entre a colaboração e a produção e o compartilhamento do
conhecimento, seja este tácito ou explícito. Ou seja, ao contrário do que
alguns pensam, a produção do conhecimento nestes cursos deve basear-se,
prioritariamente, na relação social entre os seus indivíduos e não no estudo,
predominantemente, individualizado.
Neste contexto, o modelo de criação do conhecimento
sugerido por Nonaka e Takeuchi (1997)[9]
, apresenta quatro modos de conversão do conhecimento que é interessante haver
também em cursos oferecidos totalmente ou parcialmente à distância (Figura 2).
Estes modos (Socialização, Externalização, Conversão e Internalização) serão
descritos a seguir relacionando-os à pratica de EAD.
Figura 2- Espiral do Conhecimento X quatros modos de transformação do
conhecimento
Fonte:
[Nonaka; Takeuchi, 1997]
A Socialização
acontece quando o conhecimento tácito é convertido em tácito. Como afirma Sveiby (1998), a socialização
consiste no compartilhamento de modelos e habilidades mentais, através da troca
de experiências.
(...) A
socialização é um processo de compartilhamento de experiências e, a partir daí,
da criação do conhecimento tácito, como modelos mentais ou habilidades técnicas
compartilhadas. Um indivíduo pode adquirir conhecimento tácito diretamente de
outros, sem usar a linguagem. Os aprendizes trabalham com seus mestres e
aprendem sua arte não através da
linguagem, mas sim através da observação, imitação e prática. [Nonaka,
Takeuchi, 1997, p.69]
Assim em EAD a experiência, principalmente, do
professor é compartilhada com os alunos. Esses, por sua vez, aprendem fazendo e
compartilham também o seu conhecimento. Em um curso à distância a socialização
pode acontecer em sessões de chat ou
videoconferência, a partir de diálogos interativos que favoreçam o
compartilhamento de experiências e por conseqüência, aumentam a confiança mútua
entre os participantes. Todavia, no
caso do Chat a ferramenta utilizada
deverá fornecer uma visão espacial, possuindo metáforas que apresentem um
espaço virtual similar aos espaços reais a que os alunos e professores estão
acostumados. Por exemplo, o espaço virtual pode simular uma sala de reunião
vista na realidade.
Já a Externalização
significa a transformação do conhecimento tácito em explícito. Nonaka e Takeuchi
argumentam que este mecanismo de transformação representa um processo perfeito
de criação do conhecimento, “(...) na medida em que o conhecimento tácito se
torna explícito expresso na forma de metáforas, analogias, conceitos, hipóteses
ou modelos.” [Nonaka; Takeuchi, 1997,
p.71]. A externalização pode ser
testemunhada nos processos de definição e elaboração de conceitos, estimulados
pela realização de diálogos ou por reflexão coletiva em cursos à distância.
Isso se torna aparente em Fóruns,
quando estes são bem conduzidos.
O terceiro mecanismo de transformação citado é a Combinação que representa a
transformação de conhecimento explícito em explícito.
(...) A
combinação é um processo de sistematização de conceitos em um sistema de
conhecimento. Esse modo de conversão do conhecimento envolve a combinação de
conjuntos diferentes de conhecimento explícito. [Nonaka; Takeuchi, 1997,
p.75]
A combinação torna-se presente em cursos à distância
quando, o planejamento pedagógico prevê a produção coletiva de conhecimento.
Esta produção envolve “(...) a reconfiguração de informações através da
classificação, do acréscimo, da combinação e da categorização do conhecimento
explícito (como realizado em banco de dados de computadores) pode levar a novos
conhecimentos” [Nonaka; Takeuchi, 1997, p.75].
Neste caso, sugere-se o uso do hipertextos, por exemplo, para motivar os
alunos a esse tipo de produção. Alem disso, para a troca de informações os
ambientes de aprendizagens é interessante oferecer uma variedade de recursos
(por exemplo: correio eletrônico, diário de bordo e sala de produção) que
facilitem a comunicação e gerenciamento das informações.
Por último, a Internalização
é o processo de transformação do conhecimento explícito em tácito, apresentando
uma relação estreita com o “aprender fazendo”. Ou seja, como diz Sveiby esta
fase é “(...) intimamente relacionada ao aprendizado pela prática” [Sveiby,
19998, p.56].
(...)
Quando são internalizadas nas bases do conhecimento tácito dos indivíduos sob a
forma de modelos mentais ou know-how
técnico compartilhado, as experiências através da socialização,
externalização e combinação tornam-se ativos valiosos. [Nonaka; Takeuchi, 1997,p.77].
A internalização representa todo o processo que
acontece em um curso à distância, envolvendo a integração dos outros três tipos
de transformação. Em resumo, significa o aprendizado, propriamente dito, por
cada aluno, a partir do compartilhamento de conhecimentos tácitos e explícitos,
por parte do grupo como um todo. Através da internalização o professor e os
alunos adquirem conhecimento tácito, sentindo e aprendendo com as experiências
compartilhadas. Para que a
internalização seja enriquecida, em EAD, é indubitável haver uma verbalização e
diagramação do conhecimento de cada participante, sob a forma de documentos em
geral (artigos, resenhas, imagens, relatos de experiência, entre outros). Ou
seja, a sala de produção ou Portfólio deverá estar sendo sempre
atualizada, diante das vivências e realizações dos alunos e professor.
Adicionalmente, propor atividades que estimulem o
trabalho concorrente entre grupos de alunos, objetivando a produção de um
projeto, pode representar um motivador para a internalização; principalmente,
se para executar essa atividade os alunos necessitam recorrer a todos os
conceitos teóricos que foram vistos durante o curso.
Após a elaboração e oferta dos cursos semipresenciais de
Engenharia de Software [Souza, 2003] foram experimentadas diferentes tipos de
atividades que subsidiassem os quatro modos de conversão do conhecimento.
Algumas destas atividades serão apresentadas a seguir:
As atividades em grupo, no geral,
aconteceram nos dois experimentos da seguinte forma:
¡ Professor
elaborava e disponibiliza as atividades e suas instruções de execução no
ambiente
¡ Nas instruções
eram definidas as formas de execução dessas atividades: período para
disponibilização e discussão, material a ser lido e ferramentas que deveriam
ser usadas.
¡ Cada aluno
deveria elaborar a sua contribuição e submetê-la (através do correio) para o
seu grupo. Após a realização de reuniões virtuais (via chat) e debates (pelo fórum) entre os componentes de cada grupo; as
produções individuais seriam utilizadas para a construção de uma única produção
que representaria a contribuição do grupo, a qual seria enviada para a Sala de
produção ou Portfólio.
¡ professor,
assim como os componentes de outros grupos, liam as contribuições e enviavam os
seus comentários para o Fórum, estimulando uma discussão on-line.
¡ Ao ser
finalizada a discussão, cada grupo deveria reformular as suas produções de
acordo com as contribuições apresentadas no Fórum e, muitas vezes, enviadas
através do correio pelo professor e outros grupos.
¡
Em alguns casos, quando as atividades se referiam a estudos de caso ou
questões a serem respondidas, a partir da produção de cada grupo; o professor
construía um novo material, consolidando todas as contribuições em um único
documento. Este documento continha o nome de cada aluno/grupo que sugeriu
determinado comentário e era disponibilizado novamente no ambiente. Caso um
grupo desejasse acrescentar algo neste documento, isto seria feito a partir do
envio da nova versão para o professor, que faria a revisão e o compartilharia
mais uma vez com todos.
A sala de
produção ou Portfólio representou, nos dois anos, o espaço de colaboração, onde
alunos e professores comentavam e avaliavam as produções dos outros, dando
sugestões, e fazendo criticas construtivas. Essa interação favoreceu e
estimulou a produção coletiva do conhecimento e, por conseguinte, o
seu compartilhamento.
A qualidade dos processos de geração,
compartilhamento, registro e recuperação do conhecimento em sistemas EAD estão
diretamente relacionados ao canal de mediação adotado. Caso a linguagem adotada
por este canal seja compreendida e o mesmo garanta
intensa interação entre os alunos e professores, a comunicação multidirecional
será possibilitada, o contexto interpretativo
poderá ser compartilhado e assim, o conhecimento, seja ele tácito ou explícito,
poderá ser elaborado e distribuído dinamicamente durante o processo de
ensino-aprendizagem.
Essas possibilidades desenham um cenário propício à
realização da educação à distância, pois representam alternativas para
aproximar virtualmente os envolvidos e aumentar a exploração dos recursos
tecnológicos disponibilizados. Desta forma, o conhecimento pode ser construído
colaborativamente por grupos de alunos e professores. Adicionalmente, este
conhecimento encontra um ambiente favorável a sua distribuição.
5. Referências
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* Mestranda em Ciência da Informação (UFBA/ICI). Professora pesquisadora (UNIFACS/NUPPEAD).
** PhD (University of Southampton),
professora-adjunta da FACED/UFBA, atuando nos Programas de Pós-Graduação em
Ciência da Informação e Educação, Coordenadora da REDPECT/UFBA. E-mail: tfroesb@ufba.br
[1] Acesso não-linear representando uma nova forma de armazenamento da informação e alimentação do raciocínio.
[2] McCleary em seu trabalho disponibiliza uma interessante discussão sobre as diferentes modalidades de comunicação [McCleary, 1996].
[3] Santos (2002) destaca que a informação pode ser transmitida das seguintes maneiras: a)de um agente humano para outro através de um canal de comunicação, caracterizando uma conversação; b) de um agente humano para um não humano que possua capacidade para tratar essa informação (este caso pode acontecer também na direção inversa: de um agente não humano para humano), caracterizando uma interação; c) ou uma transmissão entre agentes não humanos, representando uma conexão.
[4] A comunicação acontece ao mesmo tempo (tempo real).
[5] A comunicação acontece em tempos diferentes.
[6] Disciplina do sexto semestre pertencente ao currículo do curso de Ciência da Computação de uma Universidade localizada em Salvador – Bahia.
[7] (...) O
conhecimento tácito é altamente pessoal e difícil de formalizar, o que
dificulta a transmissão e compartilhamento com outros. Conclusões, insights e palpites subjetivos
incluem-se nessa categoria de conhecimento. Além disso, o conhecimento tácito
está profundamente enraizado nas ações
e experiências de um indivíduo, bem como em suas emoções, valores ou ideais. [Nonaka; Takeuchi, 1997, p.07]
[8] (...) conhecimento explícito corresponde à parte do conhecimento que pode ser convertido em um conjunto de informações e, portanto, ser transmitido e consequentemente, registrado em suportes artificiais, e representa apenas uma pequena parte de todo o conhecimento, aquela que pode ser formalmente articulada de maneira mais precisa. [Santos, 2002, p. 8].
[9] Esta abordagem fundamenta-se na interação circular, seguindo movimento espiral , entre os conhecimentos tácitos e explícitos, partindo do nível individual até alcançar o nível coletivo [Nonaka;Takeuchi, 1997].
[10] (...) os componentes são projetados como pequenas peças facilmente interligáveis para a construção de um modelo maior. Podem ser comparados a pequenas peças de LegoÒ que são projetadas para ser combinadas na composição de algo maior. [Santanchè; Teixeira ,2000a, p.4].